A juíza Margot Chrysostomo Correa Begossi, da 1ª Vara Criminal do Fórum de Pinheiros, aceitou ontem a denúncia (acusação formal) oferecida pelo Ministério Público Estadual contra um ex-diretor do Consórcio Via Amarela e mais 12 pessoas em razão da cratera da linha 4-amarela do Metrô de São Paulo, que deixou sete mortos em janeiro de 2007.
Com a decisão, os 13 acusados se tornam réus e vão responder ao processo criminal sob a acusação de terem sido negligentes ou imprudentes.
A maioria dos denunciados é do corpo técnico (engenheiros e geólogos). O cargo mais alto, dentre os acusados, era ocupado por Fábio Gandolfo, ex-diretor do Via Amarela. Eles foram enquadrados em artigos do Código Penal sobre desabamento seguido de morte -um homicídio culposo (sem intenção).
No despacho em que aceitou a denúncia, a juíza Begossi escreveu que as investigações apontaram “deficiências notáveis” na obra da estação Pinheiros da linha 4, como a “falta de acompanhamento” e a “ausência de ações de mitigação”.
“A princípio, é correto se concluir que todos eles [os 13 acusados pela Promotoria] tinham por obrigação e dever legal conhecer todos os aspectos que circundavam aquela construção e, consequentemente tomar medidas necessárias para evitar o evento”, escreveu.
O promotor Arnaldo Hossepian Jr. disse que não houve imperícia (incompetência) dos acusados, mas sim um “excesso absoluto de confiança” que os levou a não paralisar a obra após sinais de instabilidade. Ele afirmou ontem que um dos principais desafios será dar celeridade ao processo para evitar a prescrição das penas.
As punições a que os acusados estão sujeitos variam de 1 ano e 4 meses a 6 anos de detenção. Segundo Hossepian, se não houver uma sentença em até quatro anos, eles poderão ficar livres de condenação. No caso de um acusado (Murillo Dondico Ruiz), esse prazo pode ser inferior, de até dois anos, por ele ser septuagenário.
A preocupação é agravada por três motivos: pelo número de testemunhas (só as de acusação são 33); pela dificuldade de notificação rápida dos acusados (há relatos de que alguns estão longe, como no Pará); e pela eventual estratégia da defesa de postergar as decisões.
Um dos principais criminalistas do país, Antônio Cláudio Mariz de Oliveira, foi contratado pelo Via Amarela para acompanhar a ação e deve defender parte dos denunciados.
O promotor itiu que, mesmo se houver condenação, os réus não deverão ficar em regime fechado. “A possibilidade de alguém ser encarcerado é muito improvável”, afirmou.
Hossepian Jr. disse ter responsabilizado cinco técnicos do Metrô (dos quais quatro seguem na empresa) porque eles “poderiam exigir alterações” na obra a cargo das construtoras.
Nenhum membro da direção do Metrô foi alvo da denúncia. A obra começou com Geraldo Alckmin (PSDB) e o acidente aconteceu no início da gestão José Serra (PSDB). Hossepian Jr. alegou não ter conseguido apurar se a equipe de técnicos do Metrô sofreu qualquer “pressão política” em sua atividade -por exemplo, para acelerar as escavações antes do acidente. Disse que ele só poderia responsabilizar aqueles contra quem havia indícios e que um presidente às vezes é a última pessoa a saber.
O promotor declarou, porém, que a lista de denunciados poderá aumentar. A Promotoria já pediu para ouvir outros dois técnicos: Celso Fonseca Rodrigues, ligado ao consórcio, e Rogério Castilho, do Metrô.
Consórcio Via Amarela tentou arquivar inquérito civil sobre cratera do Metrô
Por duas vezes ao longo do ano de 2008, advogados do Consórcio Via Amarela, responsável pela construção da linha-4 do metrô, solicitaram ao Ministério Público o arquivamento do inquérito civil em andamento na Vara de Habitação e Urbanismo a respeito da cratera formada com o desabamento de parte das obras da estação Pinheiros, ocorrido em 12 de janeiro de 2007 e que deixou sete mortos. Os dois pedidos foram indeferidos em setembro e outubro de 2008.
O inquérito civil foi aberto em paralelo a investigação na área criminal. Um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) foi assinado em abril de 2007 pelo Ministério Público, Consórcio Via Amarela –responsável pela obra–, Metrô, IPT e IC (Instituto de Criminalística) e anexado ao inquérito civil. O TAC estabeleceu uma série de medidas necessárias para continuidade das obras e estabeleceu obrigações para a sua continuidade.
Entre outras coisas ele prevê um maior rigor no acompanhamento das obras e sujeita tudo o que for feito a avaliação do IPT e técnicos do Ministério Público. Um exemplo recente foi a agem do equipamento chamado shield– popularmente conhecido como tatuzão embaixo do edifício Copan, no centro de São Paulo, em novembro de 2008.
Para que o shield pudesse perfurar abaixo do Copan técnicos da Via Amarela apresentaram um relatório de que a obra era segura. Esse relatório foi submetido a técnicos do Ministério Público, que também contaram com apoio do IPT. Somente após a análise, a agem da máquina foi liberada.
“Antes que ele [shield] chegasse ao Copan foi feito um reforço da fundação e implantação de pinos [para sustentação]”. Preocupou”, disse o promotor.
Requerimentos
Na prática, se o Ministério Público aceitasse o pedido de arquivamento do inquérito civil, poderia abrir um precedente para que outros relatórios e acompanhamentos feitos pelo IPT, por exemplo, não fossem apresentados pelo consórcio.
Com isso, a transparência e segurança para que a obra tivesse continuidade estariam em risco.
“O acompanhamento do TAC é feito no inquérito [civil] e só vou arquivar quando se cumprir o TAC”, afirmou o promotor.
Ele afirmou que o acompanhamento de todos os termos do termo e do inquérito civil terão continuidade até que toda a obra seja concluída.
Via Amarela alega que ajudou nas investigações de desabamento de estação
O Consórcio Via Amarela alega que colaborou com as autoridades durante as investigações do desabamento da futura estação Pinheiros do metrô.
“O Consórcio Via Amarela vê com serenidade a denúncia do Ministério Público e entende que a Justiça é o foro imparcial e adequado para julgar o caso após a apresentação de provas documentais, materiais e testemunhais que serão feitas oportunamente”, diz a nota enviada pelo consórcio.
O Via Amarela alega que logo após o acidente priorizou o resgate das vítimas, a acomodação dos desalojados e a indenização das famílias diretamente atingidas pela tragédia. “Em um ano foram solucionados os casos dos envolvidos, sem nenhuma ação na Justiça”, afirma a nota.
O Metrô foi procurado pela Folha Online e até a conclusão do texto não havia se pronunciado sobre a denúncia.
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