A falta de rotas alternativas para escoar a safra agrícola criou uma forte concentração no sistema portuário. Sem ferrovias e hidrovias suficientes e com estradas em péssimas condições, quase dois terços dos grãos exportados acabam indo para Santos e Paranaguá. O restante é dividido entre 16 terminais espalhados pela costa, especialmente entre aqueles instalados nas regiões Sul e Sudeste, segundo dados da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq).
Se, em situações normais, essa dependência já não é saudável, num cenário de produção recorde, os problemas dobram. Os os terrestres da maioria dos portos não estão preparados para receber uma quantidade tão grande de grãos como a prevista para este ano.
Foi o que se viu em Santos nos últimos dias, com filas que ultraaram 25 km na Cônego Domênico Rangoni, que dá o ao porto. Enquanto os motoristas ficavam horas estacionados na rodovia sem conseguir chegar ao terminal, os navios permaneciam parados no mar sem poder atracar por falta de carga para carregar. Até sexta-feira, eram 76 navios na barra de Santos.
O problema é agravado pela baixa participação das ferrovias no transporte de cargas. Segundo a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), 55% da soja produzida no Brasil é movimentada em caminhões; 35% por ferrovia; e apenas 10% por hidrovia. Ou seja, a cada tonelada de aumento na safra, o número de caminhões também cresce nas estradas.
Parte dos grãos colhidos em Sorriso (MT), o maior produtor de soja do País, percorre 2.029 km para chegar a Santos. Se a BR-163, inaugurada em 1976, estivesse pavimentada, o caminho seria, pelo menos, 700 km mais curto – e, sem dúvida, mais barato. A situação de Sinop é ainda pior. São quase 1.000 km a mais por causa das restrições da rodovia. Neste ano, uma fatia da produção será desviada para o Porto de Rio Grande – distante mais de 2.800 km dos municípios.
A exportação das duas cidades – assim como a de todo Centro-Oeste – também seria beneficiada se o Brasil tivesse uma malha mais robusta de ferrovias e hidrovias que permitisse escoar a produção pelos portos do Norte. A rota é mais vantajosa financeiramente já que está mais próxima dos Estados Unidos, da Europa e do Canal do Panamá (agem para as cargas rumo a China).
Apesar disso, no ano ado, os terminais de Itaqui (MA), Itacoatiara (AM) e Santarém (PA) movimentaram apenas 14% dos grãos exportados, segundo os dados da Antaq. O coordenador do Movimento Pró-Logística de Mato Grosso, Edeon Vaz Ferreira, explica que problemas não faltam para limitar a exportação pelo Norte. Um deles é a limitação da capacidade da hidrovia que leva os grãos até Itacoatiara e Santarém. Isso sem contar na BR-163 que praticamente inviabiliza o tráfego de caminhões.
Para chegar ao porto de Itaqui, há a ferrovia Norte-Sul, que opera a partir de Palmas. “Cerca de 800 toneladas de soja do Mato Grosso são transportadas pela ferrovia. O problema é a precariedade da estrada (BR-158) para chegar até ela.” Além disso, o terminal de grãos de Itaqui demorou muito para ser construído.
Mas quem pensa que a rota para os portos do Sul e Sudeste não tem restrições engana-se. Há uma série de pontos de estrangulamento, diz Ferreira. Segundo ele, as agens por Cuiabá e Rondonópolis, por exemplo, têm sido uma tormenta para os motoristas. Para atravessar uma ponte de apenas 28 km em Cuiabá demora-se mais de três horas.
Tormenta
“A taxa recorde de produção de soja e milho, que deveria ser festejada, tem tirado o sono de todo mundo já que todos os elos da cadeia logística se esgotaram”, diz o gerente de economia da Abiove, Daniel Furlan Amaral. Ele observa que de cinco anos pra cá, a safra de grãos saltou de 135 milhões de toneladas para 185 milhões de toneladas. “Mas o que ocorreu durante esse tempo na infraestrutura? Não vemos grandes avanços.”
Desde o ano ado, a presidente Dilma Rousseff anunciou uma série de pacotes para eliminar os gargalos da infraestrutura. Mas os modelos de negócios estão sendo revistos. No caso dos portos, a MP 595 ainda terá de ser aprovada pelo Congresso.
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