BNDES quer reverter prioridade para o agro dos anos Bolsonaro

Folha de S. Paulo – Em 2022, o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) desembolsou mais recursos em financiamentos para a agropecuária do que para a indústria pelo quinto ano consecutivo.

Esse movimento começou em 2018, no governo Michel Temer (MDB), e continuou ao longo do mandato de Jair Bolsonaro (PL).

É uma situação que destoa do cenário dos anos anteriores, quando as fábricas recebiam uma parcela maior dos recursos na comparação com o campo.

Do total de desembolsos do BNDES em 2022 (R$ 97,5 bilhões), 22% foram direcionados para a agropecuária (R$ 21,5 bilhões) e 19,6% para a indústria (R$ 19,1 bilhões), segundo dados divulgados pelo banco público.

O setor de infraestrutura, que envolve atividades como energia elétrica e construção, seguiu com a maior parcela entre os segmentos (43,3%). Comércio e serviços responderam pela menor fatia (15,1%).

A participação industrial até cresceu em 2022 em relação ao ano anterior, mas ainda ficou abaixo da parcela destinada ao campo. As fábricas haviam recebido 16,2% dos desembolsos do BNDES em 2021, e a agropecuária, 26%.

“A indústria precisa se modernizar, mas os dados mostram um estreitamento nas linhas de crédito do BNDES”, afirma o economista Rafael Cagnin, do Iedi (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial).

Ele evita falar em uma dicotomia de indústria e agropecuária, já que financiamentos para o campo geram estímulos indiretos em parte das fábricas, incluindo as de máquinas e equipamentos.

Cagnin, porém, diz que faltam empréstimos de longo prazo para o setor industrial, problema associado parcialmente à redução do tamanho do banco nos últimos anos.

“Teve uma mudança de atuação do BNDES. Antes, era mais voltado para infraestrutura e indústria, mas foi se tornando um mecanismo maior de financiamento para a agropecuária, que já conta com opções como o Plano Safra e o Banco do Brasil”, diz.

Segundo o economista, as dificuldades enfrentadas pelo setor industrial a partir da crise de 2015 e 2016 também frearam a demanda por financiamentos.

Em 1995, ano inicial da série histórica disponível, as fábricas receberam 57,2% do total de desembolsos do BNDES. À época, a agropecuária havia ficado com 10,3%.

Para o economista-chefe da consultoria MB Associados, Sergio Vale, a perda de participação industrial está associada principalmente ao baixo desempenho do setor nos últimos anos.

“Vimos um crescimento forte da agropecuária com preços elevados”, afirma Vale. “A indústria está estagnada desde a crise de 2015 e 2016”, completa.

Guilherme Rios, assessor técnico da CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil), afirma que a agropecuária foi pressionada nos últimos três anos pelo aumento dos custos de produção.

Segundo ele, os preços de alguns insumos tiveram alta de mais de 200%, e as máquinas agrícolas também ficaram mais caras. “Todo esse cenário fez com que o produtor demandasse maiores volumes de recursos em seus financiamentos”, aponta.

Rios avalia que o crédito do BNDES ainda não é suficiente para as demandas da agropecuária, que prevê crescimento da safra neste ano.

“Atualmente o setor se mobiliza para uma aproximação com o mercado de capitais, buscando novas fontes de financiamento, além daquelas disponibilizadas pelo Plano Safra”, acrescenta.

NOVA DIREÇÃO FALA EM REINDUSTRIALIZAÇÃO

De acordo com Sergio Vale, da MB, a indústria tende a ganhar participação nos desembolsos do BNDES no governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Essa projeção está associada a recentes manifestações do novo comando da instituição, que fala em uma necessidade de reindustrializar o Brasil.

Ao tomar posse em fevereiro, o novo presidente do BNDES, o petista Aloizio Mercadante, disse que é “muito bom” ter o país como a “fazenda do mundo”, mas que é necessário ir além das commodities agrícolas, com olhar especial à indústria.

Mercadante voltou a tocar no assunto no dia 14 de março, em entrevista após a apresentação do balanço do banco de 2022.

“Vamos ficar assistindo ao desmonte da indústria? Ou vamos ter um banco capaz de reagir, financiar e induzir a industrialização, como fizemos com a agricultura">

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