Emissões crescem, e países precisam ampliar seus esforços

Valor Econômico – Perto da 29ª Conferência do Clima (COP29), a batalha contra o aquecimento global continua muito aquém do possível e do esperado. As metas e meios listados por 165 países apresentados até agora são completamente insuficientes para impedir que a temperatura da Terra suba além de 1,5º C, um limiar relativamente seguro e negociado pela diplomacia. O Relatório sobre Lacuna das Emissões, elaborado pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), indica que, para atingir o objetivo do Acordo de Paris, “só um salto quântico de ambição” será capaz de manter o mundo no caminho de atingir as metas climáticas.

Depois da redução compulsória causada pela pandemia de covid-19, as emissões de gases do efeito estufa (GEE), inclusive do pior deles, o metano, voltaram a crescer. Em 2023, o aumento foi de 1,3%, atingindo 57,1 gigatoneladas de dióxido de carbono (CO2) equivalente, e ficou acima da média de 0,8% de expansão registrada na década anterior à pandemia. A produção de energia continuou sendo a maior fonte global de emissões, com 26%, com mais 10% provenientes da infraestrutura para a produção do petróleo, gás e outros combustíveis. Em seguida vem o transporte (15%). As emissões da aviação internacional subiram 19,5% em 2023. Agricultura e indústria são responsáveis por 11% cada um.

No Brasil, um certo alento é que como 48% das emissões são provenientes do desmatamento, há a oportunidade de reversão com mais rapidez e sem prejuízo à sociedade.

Os países do G20 aumentaram suas emissões em 1,8% em 2023 e são responsáveis por 77% do número global. O país que mais aumentou as emissões no ano ado foi a Índia, 6,1%, revelando a conta ambiental da expansão da sua economia, e ficando à frente em taxa de crescimento da China, que emitiu 5,2% mais. Em termos per capita, porém, a Rússia está à frente de todos, com 19 toneladas de CO2 equivalente por pessoa, seguida pelos EUA, com 18.

Nesse ranking nada elogioso de emissão de GEE, o Brasil fica em sexto lugar, após China, EUA, Índia, União Europeia e Rússia, com crescimento de 0,1% em 2023. O relatório menciona que o Brasil, Indonésia e República Democrática do Congo contribuíram com 55% da geração líquidas de gases de efeito estufa provenientes de mudanças do uso da terra e das florestas, atividades que resultam em maiores flutuações das emissões em consequência de políticas públicas, desmatamento, incêndios florestais, avanços e retrocessos da proteção florestal.

Apesar desses números preocupantes, os países que aderiram ao Acordo de Paris pouco avançaram em suas promessas. Cientistas estimam que o aumento da temperatura chegou a 1,6º C neste ano, um dos mais quentes da história. O resultado ficou visível com as enchentes e secas no Brasil e outros países da América Latina e Europa, e inundações também na África.

Segundo o relatório da ONU, apesar de alguma melhoria dos compromissos originalmente assumidos, eles estão longe de evitar os cenários críticos do aquecimento global. Mesmo que todas as promessas fossem cumpridas, o aumento esperado da temperatura seria de 2,6°C a 2,8°C; e chegaria até 3,1°C ao longo deste século, com impactos devastadores para a humanidade.

Por isso, os cientistas que elaboraram o novo relatório do Pnuma estimam que os países devem agora ampliar seus esforços e se comprometer com um corte de 42% nas emissões globais de gases de efeito estufa até 2030, em relação aos níveis de 2019, para tentar manter o aumento da temperatura em 1,5º C. O empenho deverá continuar além do fim da década. O corte deverá ser de 57% até 2035, o novo marco a ser incluído nas próximas NDCs. Em um sinal aparente de capitulação, os cientistas dimensionaram também o movimento necessário para conter o aumento da temperatura em 2°C. Para isso, as emissões precisam cair 28% até 2030 em relação aos níveis de 2019, e 37% até 2035.

As consequências funestas desse cenário foram resumidas pelo físico Paulo Artaxo em duas reuniões que impressionaram o presidente Lula e ministros, em setembro. Resumindo: é impossível, com as emissões atuais, limitar o aquecimento a 2°C; as regiões tropicais serão as mais afetadas; e o agronegócio brasileiro poderá deixar de ser competitivo em breve. A matriz limpa de energia, baseada em hidrelétricas, será agudamente afetada, e os 8,5 mil quilômetros de área costeira se tornarão vulneráveis ao aumento do nível do mar. O sertão nordestino ará de semiárido a deserto (Valor, 15/10).

Tecnicamente é possível fazer a correção de rota, segundo os cientistas, que sugerem o aumento do uso das fontes solar e eólica para o fornecimento de energia; e ações para a preservação das florestas, além do aumento da eficiência no uso de energia e a adoção de combustíveis verdes no transporte e na indústria. O relatório estima que o custo seria inferior a US$ 200 por tonelada de carbono equivalente.

Há a questão financeira, ainda difícil de resolver. Os US$ 100 bilhões prometidos pelos países desenvolvidos ainda são motivo de discussão e já se fala na necessidade de quantia dez vezes maior, tema a ser discutido na COP29. O tempo é curto. As novas metas de corte das emissões têm de ser apresentadas até fevereiro, antes das negociações da COP30 no Brasil. O Brasil pode divulgar novos objetivos ainda este ano, mas isto não está assegurado.

Fonte: https://valor.globo.com/opiniao/noticia/2024/10/29/emissoes-crescem-e-paises-precisam-ampliar-seus-esforcos.ghtml

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